(este texto encerra homenagem, póstuma, aos pais do autor).
Transcorria
janeiro de 1930 quando consumou-se — pela ação sacramental do pároco
daquela freguesia longínqua —, o conúbio entre os jovens José Faustino
de Carvalho e Luiza Fortes de Carvalho. Por gosto ou promessa, os
recém-casados deliberaram dedicar-se ao fabrico de meninos. Nesse
propósito se houveram muito bem, mas a fábrica não fora tão pródiga
quanto almejavam: apenas 21 filhos em 25 anos. Apesar do feito, que
ecoou à larga por aqueles rincões sertanejos, não obtiveram a
classificação para o pódio. O título de campeão coube a um vizinho de
José, o Senhor Antônio, que atendia pelo apodo de “Antônio Pequeno”: 25
filhos em 25 anos. Imagine se esse homúnculo acudisse pelo apodo de
“Antônio Grande”.
Por causa dessa fartura de meninos os batismos e
respectivos registros cartoriais de nascimento eram feitos no atacado,
não no varejo como se opera atualmente. Se nessa época existisse Herodes
não estaria eu, produto dessa lavra de vazante fecunda, pondo em relevo
essas memórias particulares. Se, naquela época, Jesus ainda fosse uma
criança teria, quiçá, se juntado a essa chusma de petizes; buliçosa,
inquieta ao estilo das luzes intermitentes de uma árvore de natal. Mas a
sentença profética é incontornável: “tudo que foi composto será
decomposto”, tudo que foi construído será destruído. Quando a memorável
vivenda, (onde transcorreu a infância deste escriba) ostentava o parque
de diversão da trêfega confraria menineira, os seus habitantes tiveram
de arribar; partiram para a zona urbana à cata de novo abrigo.
Cumpria-se
o fadário do sertanejo: abandonar os estratos inferiores do campo e
engrossar a borra suburbana. A vivenda transfigurou-se; foi-se
esboroando até que sua tapera, em estado sepulcral, fora lacrada por uma
campa vegetal, uma floresta catingueira, hoje exuberante campão de
mato.
Embora a escassez daquelas eras tenha infligido severas
vexações aos buchos que ali coexistiram, essa miséria material
(irrelevante aos que viviam metidos no ofício da distração) não se
prestou à desvergonha, não se atreveu a semear grãos eivados de miséria
moral entre os que foram talhados por aquele molde único. Sobrerrestou,
pois, incólume, o legado ímpar: a grandeza do exemplo.
A vocês,
meus amores, — cujas lembranças (cheias de melodias e de eternidade) me
servem de bálsamo ante os revezes da vida —, ofereço-lhes este
decassílabo, da autoria do poeta Sebastião Dias. Dedico-o, também, ao
engenheiro Antônio Fortes, coetano deste escriba, que vela sua saúde no
Rio de Janeiro (e que ama o seu jardim de infância como o cisne a seu
lago).
“{...} O amor é oferta recebida
No divino altar da Santa Sé
Pra casal que se ama a vida é
A vazante reprodução da vida
Que começa na sombra da guarida Entre os dois que respeitam a união
Mas além do casal os filhos são
Os produtos de lavra da vazante
O amor é um pó fertilizante
Adubando as raízes do coração {...}”
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