segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Campo Maior por José Miranda Filho

Foto da tarde desta segunda-feira,9, por volta das 17h-Poção II Campo Maior


CAMPO MAIOR - 254 ANOS (8/8/1762 - 8/8/2016)

José Miranda Filho
Compositor, jornalista e escritor

Seu princípio vem da Fazenda Bitorocara, do conquistador Bernardo de Carvalho Aguiar, instalada ainda nos idos do Brasil colonial.

"Tem Sol mais brilhante" (*). Mais abrasador. A luz intensa amorena a tez. Provoca ebulição no sangue e escalda o coração. Atiça o ânimo. Conquanto, às vezes, possa dar sinais de esmorecimento, pachorra, vontade de deitar-se preguiçosamente. É o calor forte. Clima caloroso. Almas fraternas no relacionamento entre os conterrâneos e que acolhem os que chegam - "hospitaleira" (*). A abóbada celeste, escancarada, permite ver o predomínio do anil, com a despedida das chuvas para outras paragens, longínquas. Então, mostram sua força os ventos gerais. As pipas (papagaios) sobrevoam os telhados amarelecidos, colorindo a imensurável meia-lua cósmica.

"Tem campos, tem gado" (*). O plaino ainda verde, apinhado de bois, vacas, carneiros, bodes e outros, que, tranquilamente, saboreiam o capim-mimoso. Exibindo variadas cores e maviosos cantos, propiciam maior encanto à paisagem canários, chicos-pretos, corrupiões, juritis, cabeças-de-bode, garças, marrecas, sabiás, anuns, nambus... O sopro dos ares produzem o assobio das palmeiras. Verdadeiras florestas de carnaúba e tucum, alternando com as campinas e os capões, nos quais prepondera a unha-de-gato, cujos espinhos arranham os gibões, as perneiras, o couro dos animais, nas labutas dos vaqueiros com o gado. Com certeza, "parece um jardim" (*). Natural, que não careceu de cuidados humanos, mas bastaram-lhe as mãos generosas do próprio Artífice Supremo. "Foi aqui que Deus fez o prodígio mais brilhante" (Moisés Eulálio).

Aqui, contemplam-se as constelações com nitidez, ante a frouxidão das luzes artificiais, fazendo-se o lugar sobremaneira propicio, porquanto desprovido da intensidade que caracteriza a iluminação nas cidades grandes. O céu noturno coruscando - numerosos e minúsculos pontos - sobre olhares descansados. Uma vez ou outra, estrelas cadentes tracejam dali para acolá, aflorando, assim, a admiração singela nos rostinhos das crianças. Comporta aludir também à visão do semblante do amado ou da amada junto à Lua. Cadeiras convencionais nas calçadas, tamboretes nos terreiros, cidade e zona rural, num só tempo, os olhos alongados na mesma direção do infinito. "Tem céu (mais) estrelado" (*), pois não!?

São alguns veios d'água. Antes, os três maiores - para dizer que também fluem córregos, riachos - deslizam serenamente, serpeando na imensidão da planura, por entre flora vária. Lá adiante, ao norte, tocam-se, interligam-se: largo abraço. Daí para a frente, apenas um - Longá -, transportando as águas dos dois outros, segue o curso para o encontro com o maior deles - Parnaíba.

Cortando a cidade, o Surubim, farto habitat do peixe que, sugestivamente, dá-lhe o nome. "Surubim, onde os pe(s)cadores pe(s)cam peixes e sereias de coxas grossas e sem escamas na água de suas margens, na maciez de suas moitas mornas" (Elmar Carvalho). Saltos "mortais" da garotada corajosa do alto da ponte, nos anos de bons e alegres invernos. Nestes, correntezas impetuosas invadem quintas de caju, transpõem o paredão de barragem, que já engoliu nadadores afoitos. Mais ali, água rasa, nivelando-se com as beiras adornadas de maiôs e biquinis discretos, em manhãs ora ensolaradas, ora cheias de nuvens cinzentas.

Ladeando - entrincheirando - a urbe, o Longá, irrompendo carnaubais e mufumbais, encharcando as "Pintadas" dos criolis, guabirabas, muricis e maçãs de rio, das divertidas colheitas pela meninada, por gente das redondezas, enfrentando sucuris. "Preso à teia do enlevo, suponho dentro d'alma ouvir o langoroso e doce murmurar das águas do Longá" (Mário da Costa Araújo).

"A treze de março, lá no Jenipapo, comprou com seu sangue nossa independência" (*). É o mais distante dos rios, légua e meia a leste do centro urbano. O de maior notoriedade, o mais enaltecido. Transbordante nos copiosos invernos, reduzia-se a um filete espelhado, imóvel, no meio do álveo - apenas um regato -, em 1823. Milhares de homens valentes puderam fazer sua travessia sem dificuldade. Sobre o barro endurecido do leito, sobre o mato rasteiro, ressequido pela estiagem, das suas margens, "sangue piauiense correu em ondas" (Abdias Neves) - pavorosa hecatombe na qual tombaram feridos ou mortos centenas de conterrâneos. Sangue vertido pela liberdade, num combate sem igual. "Ali, ao lado do norte, ouviu-se um brado de morte, foram bravos que caíram! foram homens destemidos que lá tombaram feridos às balas de Fidié" (Moisés Eulálio). Por isso, "Sinto orgulho de ser um seu filho" (*). Gleba de heróis - do passado, do presente e de sempre -, ressaltando o vaqueiro e o lavrador, que fizeram surgir este Estado.

"Cartão de visita do meu Piauí" (*). Velhos casarões de antigas histórias, na cidade e no campo. O bucolismo inspirado nas fazendas de gado, "onde outrora havia banhos de leite" (H. Dobal). O Açude Granonde, o "lago" (conforme a expressão do arrebatado cronista Octacílio Eulálio) urbano, o que é incomum em terras brasileiras. Recanto do multicolorido - indescritível! - pôr do sol. Reflexos da graciosa natureza sobre a água serena do Açude, ao mesmo tempo cenário e testemunha de contemplativos espíritos e de enamoradas confissões e jutas de amor.

No horizonte, a sudeste, onde as pinceladas do Criador foram mais vivas, ergue-se a Serra Azul de Santo Antônio - a "urna" (Octacílio Eulálio) que encerra infinidades de mistérios até hoje insondáveis. "Dizem que nela vagam fantasmas de uns padres que em suas entranhas enterraram ouro" (Elmar Carvalho).

"Hospitaleira, majestosa, altaneira" (*). "Ei-lo de flores cercado... Não sei onde outro mais belo... Mimosa flor do sertão... Tudo tem graça e beleza" (Moisés Eulálio). Berço de gente simples, como também de vultos que o engrandeceram (no passado) e engrandecem-no (no presente) e, peculiarmente, simpática, acolhedora, solidária, crente em Deus e - em sua maioria - devota do Antônio, padroeiro do festivo mês de junho, que reúne todos na catedral e na praça das barracas, para o afável e sincero gesto de fraternidade, como única família. Dileta terra, consoante se extrai da declaração: "Ah, como gosto de ti, se é verdade que existe vida após a morte, então quero de novo nascer aqui" (Prof. Assis Lima). Majestosa e altaneira na gloriosa história de seu povo, que, neste agosto, celebra o 254º aniversário de fundação da Vila - uma das sete primeiras do Piauí -, exaltando sua irrefutável tradição.

Salve 8 de Agosto! Brademos viva Campo Maior com o "orgulho dos filhos seus!" (*).


(*) Versos do Hino Municipal (Profª Valmira Napoleão).

Um comentário:

  1. Tive a honra de trabalhar com José Miranda no saudoso "Jornal A Luta", aprendi muito com este intelecto campomaiorense. Alguns versinhos exaltando a minha querida Campo Maior, tento ser poeta, acho que tenho um dom.


    Há tanto tempo
    Deixei Campo Maior
    Parti chorando
    De saudades.


    Serra de Santo Antonio
    Nuvens que passeiam
    Nuvens que
    Beijam A Serra.


    Na orla
    Do Açude Grande
    Deixei meus passos
    E meu olhar
    Do pôr do sol.


    No Rio Pintadas
    Mergulhei
    Saciando a minha sede.


    Do fruto da carnaúba
    Matei a minha fome
    E da sua aba
    Fiz o meu abrigo.


    Um abraço ao José Miranda, grato a Luselene pelo espaço.
    Em breve estarei em C. Maior, reencontrando alguns amigos que ainda habitam essa cidade...a verdade eu faço rota entre Sp, Maranhão e Piaui sempre com frequência.







































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